Tulipa Ruiz retoma sua discografia com originalidade e ousadia em ‘Habilidades Extraordinárias’

Após cinco anos desde seu último álbum totalmente inédito, ‘Dancê’ (2017), Tulipa Ruiz lança ‘Habilidades Extraordinárias’, e reafirma porque é uma das artistas mais originais e relevantes do cenário musical brasileiro atual. Fugindo dos clichês requentados da MPB, mas reverenciando na medida certa os clássicos, a cantora segue em um caminho único.

Tulipa Ruiz Habilídades Extraordinárias
Capa de ‘Habilidades Extraordinárias’, novo álbum de Tulipa Ruiz. (Foto: Divulgação).

O tempo em que ficou longe da sua discografia, porém dedicada a vários outros projetos, serviu como uma ótima adição a bagagem musical de Tulipa e do seu irmão e parceiro Gustavo Ruiz. Na nova leva de 11 faixas inéditas, a dupla utiliza referências dos discos anteriores, porém avança em experimentações que surpreendem e se revelam a cada nova audição.

Em um primeiro contato, ‘Habilidades Extraordinárias’ pode soar difícil e menos acessível que os álbuns anteriores de Tulipa Ruiz, mas na verdade, esta é uma obra que requer tempo e calma, aos poucos ela vai se revelando para o ouvinte e vai recompensando com muita riqueza musical e diferentes momentos e climas, igualmente prazerosos.

O disco reflete sobre a vida pós-pandemia de covid-19 e o caos político e social vivido pelo Brasil e o mundo nos últimos anos. O título serve como símbolo de resistência e afirmação da força artística da cantora.

Tulipa explica a escolha contanto a história de que quando ela e o irmão estavam na embaixada dos Estados Unidos para tirar um visto para tocar no Lincoln Center, em Nova York, o consul perguntou se eles possuíam alguma “Habilidade Extraordinária”. A cantora estranhou e não soube o que responder, Gustavo acabou sendo mais rápido e respondeu que eles haviam ganhado um Grammy Latino, o que deixou o funcionário admirado, facilitando o acesso ao visto.

Tulipa Ruiz Habilidades Extraordinárias
(Foto: Divulgação)

Tanto a história quanto o título do álbum em si simbolizam bem o uso que a cantora faz da música como manifesto em favor da cultura, da arte e como forma de canalizar todos os sentimentos que permearam grande parte dos brasileiros nos últimos anos. Tudo isso, no entanto, é feito de maneira leve e com muito ritmo, fugindo de uma estética soturna.

“Samaúna”, foi a primeira faixa divulgada e é a que abre o disco. Ela resume bem a essência da obra e possui uma harmonia complexa que vai se desvendando aos poucos. Ela parece filha de “Banho”, música feita para Elza Soares e presente no álbum ‘Deus é Mulher’ (2018).

“Kamikase Total” faz reflexões sobra vivências femininas e as conceções cotidianas que são feitas ao “ego machucado, brocha”, masculino. A faixa-título sintetiza o caráter de resistência e sobrevivência da obra. “Vou Te Botar No Pau” é um excelente rock que vai se misturando com um pouco do que foi feito em ‘Dancê’.

Tulipa Ruiz Habilidades Extraordinárias
(Foto: Divulgação)

O encerramento fica com “O recado da Flor” que traz a luxuosa colaboração de João Donato e funciona como uma finalização que desacelera e traz um clima ameno e agradável, aliado a um tom otimista.

Em ‘Habilidades Extraordinárias’, Tulipa Ruiz mostra porque continua sendo uma figura única na atual geração da MPB e entrega um álbum multifacetado, intenso, que explode em criatividade, faz uma leitura da realidade fora do óbvio, porém precisa. Com o nono álbum, a artista mostra que sempre está em movimento e se aperfeiçoando.